domingo, 23 de agosto de 2009

III - Fisiologia Cardíaca

1 – O Coração e o Bombeamento Cardíaco
O coração consiste em duas bombas separadas: um coração direito que
bombeia o sangue através dos pulmões e um coração esquerdo que bombeia o
sangue através dos órgãos periféricos. O átrio funciona principalmente como
uma bomba fraca, que auxilia a impulsionar o sangue para o ventrículo. O
ventrículo, por sua vez, fornece a principal força para propelir o sangue
através das circulações pulmonar e periférica.
O músculo cardíaco é estriado, da mesma forma que o músculo esquelético
típico. Os discos intercalares são membranas que separam as células
musculares cardíacas umas das outras. Ou seja, as fibras musculares cardíacas
são formadas por muitas células individuais conectadas em série entre
si. A resistência elétrica através dos discos intercalares é somente 1/400
da resistência através da membrana externa da fibra muscular cardíaca.
As membranas celulares se fundem de tal maneira que se formam junções
comunicantes “gap junctions” muito permeáveis, as quais permitem a difusão
relativamente livre de íons. O múscul cardíaco é um sincício de muitas células
musculares cardíacas, no qual as células cardíacas são tão interconectadas
que, quando uma dessas células é estimulada, o potencial de ação
se propaga para todas as outras, transmitindo-se de célula em célula e também
propagando-se através da rede de interconexões.
O coração é formado por dois sincícios distintos: o sincício atrial e
o sincício ventricular. Normalmente, os potenciais de ação podem ser conduzidos
do sincício atrial para o sincício ventricular somente por meio de um
sistema de condução especializado, o feixe atrioventricular. Os eventos
cardíacos que ocorrem desde o início de um batimento cardíaco até o início
do batimento seguinte denominam-se ciclo cardíaco.
Cada ciclo começa pela geração espontânea de um potencial de ação no
nodo sinusal. O ciclo cardíaco consiste em um período de relaxamento denominado
diástole, durante o qual o coração se enche de sangue, seguido por
um período de contração denominado sístole. O sangue normalmente flui das
grandes veias para os átrios; aproximadamente 75% do sangue fluem diretamente
dos átrios para os ventrículo antes mesmo que os átrios se contraiam.
A contração atrial provoca um enchimento adicional dos ventrículos de cerca
de 25%.
Bulhas Cardíacas: A primeira bulha está relacionada com o fechamento
das valvas tricúspide e mitral e com a abertura das valvas aórtica e pulmonar.
A segunda bulha ocorre no momento em que se fecham as valvas aórtica e
pulmonar. Após a segunda bulha, 75% do sangue atrial desce passivamente
para os ventrículos e causam a terceira bulha ao bater na parede ventricular.
A quarta bulha ocorre devido à contração atrial que impulsiona os 25%
restantes de sangue para os ventrículos. Quando há desdobramento da segunda
bulha, a valva aórtica fecha antes que a pulmonar.
A energia química para a contração cardíaca é derivada principalmente
do metabolismo oxidativo de ácidos graxos. Portanto, a intensidade do consumo
de oxigênio pelo coração é excelente indicador da energia química liberada
enquanto o coração realiza seu trabalho.
A capacidade intrínseca do coração de se adaptar aos diferentes volumes
de sangue que fluem para o seu interior é denominada mecanismo de
Frank-Starling do coração. A eficiência do bombeamento cardíaco é muito
controlada pelos nervos simpáticos e parassimpáticos (vagos), que suprem
com abundância o coração. A quantidade de sangue bombeada pelo coração a
cada minuto constitui o débito cardíaco.
A excitação do coração é feita pelos nervos simpáticos e a diminuição
dos batimentos cardíacos ocorre devido ao estímulo parassimpático (vagal).
2 – A Excitação Rítmica do Coração
O coração possui um sistema especializado para a geração de impulsos
rítmicos que produzem a excitação que provoca a contração rítmica do músculo
cardíaco e para a condução rápida desses impulsos através do coração.
O sistema especializado de excitação é composto pelo nodo sinusal ou
sinoatrial (SA), onde é gerado o impulso rítmico normal; pelas vias internodais,
que conduzem o impulso do nodo sinusal para o nodo atrioventricular;
pelo nodo atrioventricular (AV), onde o impulso proveniente dos átrios
é retardado antes de passar pelos ventrículos; pelo feixe atrioventricular,
que conduz o impulso dos átrios para os ventrículos; e pelos feixes esquerdo
e direito das fibras de Purkinje, que conduzem o impulso cardíaco a todas
as partes dos ventrículos.
Muitas fibras cardíacas têm a capacidade de auto-excitação, um processo
que pode causar descarga automática rítmica e contração. Esse é o
caso particular das fibras do nodo sinusal. Por essa razão, em condições
normais, o nodo sinusal controla a frequência dos batimentos de todo o coração.
O nodo sinusal está localizado na parede ântero-superior do átrio
direito, abaixo do óstio da veia cava superior.
O nodo atrioventricular é especializado para causar um retardo na
condução do impulso na passagem dos átrios para os ventrículos. Esse retardo
fornece tempo para os átrios esvaziarem o excesso de sangue nos ventrículos,
antes do início da contração ventricular. O nodo AV está localizado
na parede septal do átrio direito, imediatamente posterior à valva tricúspide.
As fibras de Purkinje conduzem o impulso a partir do nodo AV para os
ventrículos em alta velocidade. O feixe se divide em ramos esquerdo e direito,
que se situam sob o endocárdio dos dois lados do septo. O impulso se
propaga quase imediatamente para toda a superfície do endocárdio do músculo
ventricular.
O nodo AS controla os batimentos cardíacos porque sua frequência de
descargas rítmicas é maior do que a de qualquer outra parte do coração. Um
marcapasso em qualquer outra região do coração que não o nodo SA é denominado
marcapasso ectópico. Evidentemente, um marcapasso ectópico causa uma
sequência anormal de contrações das diferentes partes do coração, podendo
provocar diminuição do bombeamento cardíaco.
O coração é provido de nervos simpáticos e parassimpáticos. Os nervos
parassimpáticos (vagos) estão distribuídos principalmente nos nodos SA, AV,
em menor densidade na musculatura atrial e, em proporção menor ainda, na
musculatura ventricular. Por outro lado, os nervos simpáticos distribuem-se
para todas as partes do coração, com grande presença no músculo ventricular.
A estimulação parassimpática (vagal) pode diminuir ou mesmo bloquear
o ritmo e a condução no coração. A estimulação dos nervos parassimpáticos
provoca a liberação do hormônio acetilcolina nas terminações vagais. Entretanto,
mesmo que a estimulação parassimpática seja suficientemente intensa
para parar o coração, no máximo em 20 segundos, algum ponto das fibras
de Purkinje, em geral a porção do feixe AV no septo ventricular, desenvolve
um ritmo próprio e causa contração ventricular na frequência de 15
a 40 bpm. Esse fenômeno é denominado escape ventricular.
A estimulação simpática causa essencialmente efeitos opostos aos da
estimulação parassimpática sobre o coração. Ela aumenta a frequência das
descargas no nodo SA, a velocidade de condução e o nível da excitabilidade
em todas as regiões do coração. A estimulação dos nervos simpáticos libera
o hormônio norepinefrina, que aumenta a permeabilidade da membrana da fibra
ao sódio e ao cálcio.
O aumento da permeabilidade aos íons cálcio é, pelo menos parcialmente,
responsável pelo aumento na força de contração do músculo cardíaco sob
a influência da estimulação simpática, pois os íons cálcio desempenham um
importante papel na estimulação do processo contrátil das miofibrilas.
3 – Eletrocardiograma e Anormalidades Cardíacas
À medida que o impulso cardíaco se propaga através do coração, as correntes
elétricas se espalham pelos tecidos que o circundam e uma pequena proporção
se propaga até a superfície do corpo. Ao colocar eletrodos sobre a pele, em
lados opostos do coração, os potenciais elétricos gerados por essas correntes
podem ser registrados. Esse registro é conhecido como eletrocardiograma
(ECG).
O eletrocardiograma normal é composto por uma onda P, um “complexo QRS” e
uma onda T. O complexo QRS é comumente formado por três ondas distintas, a
onda Q, a onda R e a onda S. A onda P é produzida por potenciais elétricos
gerados à medida que os átrios se despolarizam, antes de contrair-se. O
complexo QRS se deve aos potenciais gerados quando os ventrículos se despolarizam,
antes de contrair-se. Assim, tanto a onda P quanto os componentes
do complexo QRS são ondas de despolarização. A onda T é devida aos potenciais
gerados durante a recuperação dos ventrículos do estado de despolarização,
sendo uma onda de repolarização.
Antes que a contração do músculo possa ocorrer, a despolarização deve se
propagar através dele para iniciar os processos químicos da contração. A
onda P ocorre, portanto, no início da contração dos átrios e a onda QRS
ocorre no início da contração dos ventrículos. Os ventrículos permanecem
contraídos por uns poucos milésimos de segundo após a ocorrência da repolarização,
ou seja, até após o término da onda T.

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